Liberdade
O menino cresceu ouvindo dizer que não era para se preocupar, que Deus cuida. Cuida de Jerusalém, cuida de de Tel Aviv, das ruas e das árvores de Ramallah, cuida de Gaza, de Rehovot, cuida de Ashkelon, das crianças e dos velhos que optaram por não partir. Que Deus fala o árabe, também fala o hebraico, e se preocupa com o povo da região.
Enquanto isso, bombas, bombas, bombas, metralhadoras, granadas, degolas, mais bombas, avassalam a Faixa de Gaza, a região dos kibutz, massacres e sequestros se sucedem, milhares de crianças são mortas, mulheres estupradas, idosos sequestrados, hospitais sem luz, sem anestesia, corpos cortados, ambulâncias atacadas. O ódio guindado ao nível mais elevado.
Já no purgatório, após morrer, vítima da uma explosão ocorrida ontem, na ambulância que levava seu pai, e que o acompanhava, os dois únicos sobreviventes de uma explosão que matou sua mãe, que ficou para trás, e seu irmão, de 8 anos, Kamal ou Ezequiel, como preferirem, com 12 anos de idade, sem nenhum envolvimento com as questões políticas da região, é indagado, por um homem de branco, sobre aonde prefere ser conduzido:
– Se para o reino do céu, na presença de Deus, ou para o reino da trevas, com o diabo?
Kamal ou Ezequiel, como for de nossa preferência, não demora muito para responder:
– Senhor, por favor, eu quero ir para o reino das trevas.